quarta-feira, dezembro 30, 2009

Paz sobre todas as Fronteiras


No final de um ciclo de vivências, num homem numa mulher, o que resta? Qual é a importância das conquistas?

Juntei-me um grupo de jovens à volta de uma mesa. Festejavam o casamento de um casal de entre eles. Desfasado na idade, em silêncio fiquei como um caçador furtivo de emoções. Quis aproveitar a descontracção e oportunidade para entender o mais possível como se comunicavam, seus mecanismos, suas características, identificar os códigos de comunicação, os gestos, os tiques e os toques….

Cheguei a uma conclusão surpreendente revendo em analogia, a minha própria experiência em semelhante idade. Também eu à vinte anos atrás apresentava exactamente a mesma essencialidade nos gestos, nos tiques e nos toques para socializar.

É incrível, vinte anos e para além da indumentária, que mudou, dos acessórios e de tudo o resto, algo de essencial no ser permaneceu igual, estagnado e intocável.

Afinal o que é essa essencialidade?

Reconheço que no ser humano, neste caso no/a jovem adulto, ser uma espécie de habilidade comunicativa do seu essencial. É a autenticidade. E o jovem de hoje apresenta os mesmos hiatos comunicativos que o de à vinte anos atrás, daí o desenvolvimento de seu formato essencial ter parado no tempo. Precisamente na área da comunicação.
Mudou alguns dos símbolos e dos acessórios, por vezes até empobrecivamente ou algo desorientadamente, sem dúvida mantém as mesmas dificuldades comunicativas, fracos níveis de autenticidade.

Parece carregar enfim, em seu jovem ombro o peso das mesmas máscaras que no meu tempo de jovem carreguei, não evoluiu nessa matéria. Consternado verifico a actualidade do paradigma. Não mudou, e dentro de tanta ansiedade gerada, em que o ego leva a melhor por se encontrar em seu terreno de eleição, a essencialidade de cada um timidamente procura a si mesma nos exemplos alheios, quando é em si mesma, sobre si mesma, que se deveria encontrar, que se deveria identificar e onde se encontra o único exemplo verdadeiramente importante para si mesma, que vale a pena seguir.


Se cada um de nós em consequência, se observar com coragem e honestidade, não se vai maltratar, não se vai envenenar, antes pelo contrário, vai estar atento na promoção de si mesmo, de uma forma saudável  e sustentável.
 



Meus votos são de autenticidade para todos, para que enfim se promovam os encontros genuínos entre os seres, e a hipocrisia e o mal entendido definitivamente sejam expurgados do plano, e após a tempestade venha a bonança.

Paz sobre todas as Fronteiras.

quarta-feira, dezembro 16, 2009

Um encontro singular

Na manhã apenas desperta, o homem se levantou. Na tristeza de que se sentia envolvido, olhou para o filho doente, que gemia no leito pobre.
A esposa dormia e ele se preparou para sair antes que ela despertasse, com o mau humor habitual.
Seu rumo era o mercado, onde ele recolhia os frutos desprezados por aqueles que têm em demasia e desconhecem a dor do estômago vazio.
Um movimento inusitado, no entanto, lhe chamou a atenção. Eram gritos, correria. O povo se acotovelava formando um cortejo barulhento.
Soldados da Roma dominadora e audaciosa conduziam um condenado à morte.
O homem parou a observar aquela cena e pensou que Aquele prisioneiro era muito mais infeliz do que ele próprio. As suas eram as dores morais: doíam por dentro. Mas aquela criatura Se apresentava machucada, sem forças, a carregar aos ombros um madeiro bruto e pesado.
Seus passos eram vagarosos, como num compasso de sinfonia fúnebre.
Arcado, a túnica que vestia arrastava-Se pelo chão, embaraçando-Lhe os pés, dificultando-Lhe ainda mais o caminhar.
Cireneu estava estático. O homem estava sendo conduzido para o terrível suplício da cruz. Era, sim, muito mais infeliz que ele próprio.
Nisso, a voz de Roma, na aspereza de um dos soldados, lhe ordenou auxiliar o condenado que caíra.
Não que o soldado se condoesse da Sua dificuldade. É que tinha pressa de se desenvencilhar daquela tarefa.
Cireneu foi praticamente jogado para debaixo daquela madeira bruta, cheia de farpas. Colocou o ombro ao lado do condenado e suspendeu o peso.
Sentiu uma dor profunda no ombro e o olhar do auxiliado o penetrou. Eram dois olhos de luz estampados numa face de sofrimento.
Jamais Cireneu haveria de esquecer aquele olhar. A dor no ombro aumentava. Logo adiante, o prisioneiro voltou a tropeçar e cair.
As chicotadas da brutalidade O atingiram. Um pouco mais e o Cireneu teria o peso da madeira tosca aliviado. O homem a estava utilizando. Crucificado.
Cireneu aguardou-lhe a morte. Algo Nele o atraía, magnetizava-o .
Quando tudo se consumou, foi para casa e, porque chegasse de mãos vazias, a esposa o repreendeu.
Cireneu não revidou. Uma paz diferente tomava conta dele.
O filho veio correndo e o abraçou:
Estou bem, papai!
Cireneu recordou os olhos azuis da gratidão do homem que ele auxiliara. Um perfume sem igual penetrou o lar pobre.
A mulher sentiu e se enterneceu. Uma delicada e subtil presença sentiram os três.
A vida de Cireneu se transformou. Apesar das lutas e dissabores, nunca mais o fantasma do desespero fez morada em sua casa.
Curioso, no dia seguinte, foi indagar a respeito da identidade do condenado. Descobriu-lhe o nome. Chamava-se Jesus de Nazaré.

*   *   *

Quando Jesus penetra o coração da criatura, tudo se transforma. O deserto da solidão descobre o oásis do amor e abandona a tristeza.
As dores se amenizam. A paz se faz presente.

Jesus é sempre o meigo Pastor a convidar: Vinde a mim, vós todos que sofreis, estais aflitos e sobrecarregados... 

com base no cap. 4 do livro As testemunhas da paixão, de Giovanni Papini, ed. Saraiva

acto continuo...

quando reflectes e vês tudo... 

é quando te apercebes que vês coisas
que não havias reparado.

quarta-feira, dezembro 09, 2009

Perfume de Jesus

Ao percorrer a história da Humanidade sempre se encontra um rastro perfumado. No princípio, era o incenso, a mirra e outras madeiras aromáticas.
O Velho Testamento regista Moisés construindo um altar de perfumes para Jeová. Entre eles craveiro e rosas.
Depois vieram os unguentos e óleos de substâncias como o timo e o orégano, com que faraós do antigo Egipto eram enterrados.
Nas culturas antigas, o perfume era reservado aos deuses e aos rituais. Mas não demorou muito para que simples mortais se apropriassem das receitas perfumadas dos sacerdotes.
Nos grandes centros do Oriente, bem como entre os gregos e romanos, o prazer de perfumar-se tornou-se um hábito quotidiano.
Paris, no século dezasseis, era já considerada a capital dos perfumes. Atribui-se à Catarina de Médicis, que lá chegou em 1533, o impulso decisivo à produção e comércio de produtos aromáticos.
Além de perfumes, pomadas e óleos aromáticos, a moda dos couros perfumados, utilizados na confecção de luvas e outros acessórios difundiu-se pela Europa.
Os aromas, libertos da função dissimuladora de odores desagradáveis, tornaram-se mais doces e suaves, predominantemente florais.
Perfumistas buscavam essências raras e exóticas em flores, ervas, madeiras, resinas e secreções animais para suas fórmulas secretas.
Na perfumada corte de Luís XV, era de bom tom apresentar-se com um perfume diferente a cada dia. E nas datas de festa até os chafarizes eram alimentados com água-de-lavanda ou água-de-rosas.
Todos os perfumes, por mais preciosos ou penetrantes, têm, no entanto, a durabilidade comprometida. Nenhum que seja de carácter permanente. Eis porque proliferam as indústrias de perfume. Esmeram-se no aroma e na durabilidade.
Há todavia um perfume indelével. Personificado em um corpo de homem, andou pela Terra há mais de dois mil anos.
Nascido na quietude de uma noite quase fria, teve Seu nascimento anunciado por um coro de vozes celestes.
Cresceu no ambiente do lar, da oficina e da escola. Adulto, buscou os homens para espalhar a Sua doce fragrância.
Seu próprio nome semelhava aroma raro. Extracto de estrelas saía de Sua boca. Onde quer que passasse, a delicadeza da Sua presença a tudo e todos impregnava.
A Ele se submeteram ricos e poderosos, embora pensassem serem vencedores. Imprimiu tal aroma na alma dos Seus apóstolos que O decidiram imortalizar para a posteridade. Desta forma, os evangelistas se esmeraram para colocar em frascos delicados a essência dos Seus ditos.
Nasceram então os Evangelhos de Mateus, de Marcos, Lucas e João. É por este motivo que toda vez que se abrem as páginas da Boa Nova, o aroma do Cristo se espalha.
Quando a criatura se deixa impregnar por ele, onde quer que esteja e atue, aromatiza lugar, pessoas e circunstâncias.
*   *   *
Quando você estiver triste e desiludido, observando o mundo cinza e negro, busque o Evangelho. Descerre-lhe as páginas. Concentre-se na leitura de um pequeno trecho.
Permita-se envolver pelo perfume da tranquilidade e da serenidade do doce Jesus da Galiléia.
Não eram diferentes aqueles tempos. Também havia rixas, guerras, corrupção e desonestidade. Mas Ele espalhou a penetrante fragrância da Boa Nova, o extracto do bem.
Use o perfume Dele para colocar um sorriso na face, e distribuir alegria.
Torne-se, onde esteja, um distribuidor do perfume da verdade e da paz.
*   *   *
Atribui-se a Mateus o primeiro Evangelho. Escrito em língua hebraica, acredita-se que ele próprio o traduziu para o grego.
O evangelista Lucas não conheceu pessoalmente Jesus. Seu Evangelho, possivelmente escrito entre os anos 55 e 60, é uma verdadeira obra de História.
Para Lucas, Cristo é o Divino Médico da Humanidade.

com base no artigo A pátria dos perfumes, da revista Ícaro, revista de bordo Varig nº 134.